Após ser novamente denunciado, Dirceu é solto pelo Supremo

Horas depois das declarações do procurador Dallagnol, Supremo Tribunal Federal decidiu conceder habeas corpus ao ex-ministro. Dirceu está preso há quase dois anos em Curitiba.

O ministro relator da Lava Jato no Supremo, Luiz Edson Fachin, foi à sessão disposto a reverter uma onda de derrotas na Segunda Turma. Semana passada, Fachin votou pela manutenção das prisões de João Cláudio Genu, ex-tesoureiro do Partido Progressista, e do pecuarista José Carlos Bumlai, réus na Lava Jato. Perdeu nos dois casos.

Nesta terça-feira (2), Fachin leu trechos da sentença do juiz Sérgio Moro, afirmando que a prisão de José Dirceu interrompe um estilo de vida criminoso. Fachin defendeu que não há “constrangimento ilegal” em manter Dirceu na cadeia.

“Em resumo, senhor presidente, entendo que a manutenção da prisão preventiva do paciente encontra-se plenamente justificada pela lei e pela jurisprudência desta corte, inclusive desta Segunda Turma. Rememoro que, para esta Segunda Turma, é justificada a prisão preventiva quando fundada na garantia da ordem pública, em face do risco concreto de reiteração delitiva, habeas corpus 140-215, hipótese que deve ser observada mesmo quando o crime é praticado contra a administração pública, máxime num contexto fático de associação criminosa”.

O ministro Dias Toffoli discordou. Segundo ele, podem ser tomadas outras medidas cautelares como a tornozeleira eletrônica. Toffoli citou o ministro Teori Zavaski:

“Não se nega que sociedade tem justificadas razões para se indignar com a notícia de cometimentos de crimes como os aqui indicados, e de esperar uma adequada resposta do Estado no sentido de identificar e punir os responsáveis. Todavia, a sociedade saberá também compreender que, a credibilidade das instituições, especialmente do Poder Judiciário, somente se fortalecerá na exata medida em que for capaz de manter o regime de estrito cumprimento da lei”.

O ministro Ricardo Lewandowski também votou pela soltura do ex-ministro, mas entendeu que o Tribunal Regional Federal, que julga em segunda instância os recursos da Lava Jato, deve acelerar o julgamento de José Dirceu.

“Já se vão quase dois anos de prisão cautelar, sem que sequer haja previsão para data de julgamento do paciente no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, não se podendo impor ao paciente que aguarde preso indefinidamente eventual condenação no segundo grau de jurisdição”.

Em seguida, Celso de Mello votou para que Dirceu continue preso e empatou o placar.

“Não fosse a ação rigorosa mas necessária do Poder Judiciário é provável que a corrupção e lavagem de dinheiro estivessem perdurando até o presente momento. O fato é que quer sejam os crimes violentos ou não ou crimes com graves danos ao erário, a prisão cautelar justifica-se para interrompê-los e, o que é mais importante, para proteger a sociedade e outros indivíduos de sua reiteração. Tenho para mim que se torna, por isso mesmo, inviável a conversão da prisão preventiva em medidas cautelares alternativas”.

E citou decisão de Sérgio Moro para afirmar que Dirceu cometeu crimes até enquanto era julgado no mensalão.

“O mais perturbador, porém, em relação a José Dirceu de Oliveira e Silva, consiste no fato de que recebeu propina inclusive enquanto estava sendo julgado pelo plenário do Supremo Tribunal Federal, quando estava sendo julgada pelo plenário do Supremo Tribunal Federal a ação penal 470, o mensalão, havendo registro de recebimentos pelo menos até 13 de novembro de 2013. Nem o julgamento condenatório pela mais alta corte do país representou fator inibitório da reiteração criminosa, embora em outro esquema ilícito. A necessidade da prisão cautelar decorre ainda do fato de José Dirceu de Oliveira e Silva ser recorrente em escândalos criminais”.

O fiel da balança foi o ministro Gilmar Mendes, presidente da Segunda Turma do Supremo. Ele deu o voto de minerva que devolveu a liberdade a José Dirceu enquanto ele aguarda o julgamento em segunda instância.

Ao final, o ministro Gilmar Mendes criticou o fato de o Ministério Público Federal em Curitiba ter anunciado uma nova denúncia contra José Dirceu no mesmo dia em que o Supremo julgaria o pedido de liberdade. Para ele, foi uma forma de tentar pressionar a corte.

“Se nós devêssemos ceder a esse tipo de pressão, quase que uma brincadeira juvenil – são jovens que não têm a experiência institucional nem vivência institucional, por isso, fazem esse tipo de brincadeira – se nós cedêssemos a esse tipo de pressão, nós deixaríamos de ser Supremo. Curitiba passaria a ser o Supremo. Não se pode imaginar que se pode constranger o Supremo Tribunal Federal porque esta corte tem história mais do que centenária. Ela cresce nesses momentos. Creio que hoje este tribunal está dando lição ao Brasil”, disse Gilmar Mendes.

Agora cabe ao juiz Sérgio Moro definir as regras que José Dirceu terá que respeitar assim que sair da cadeia.

Logo depois do fim da sessão, o procurador Deltan Dallagnol usou a internet para dizer que considera a decisão incoerente.

O procurador citou, como argumento, outros três julgamentos recentes da Segunda Turma, que mantiveram as prisões de pessoas em situação que o procurador considera de menor gravidade.

Entre os exemplos, Dallagnol citou o caso do ex-prefeito Delano Parente, também acusado de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa. O ex-prefeito teve o habeas corpus negado porque a prisão tinha sido baseada na prática habitual e reiterada dos crimes. Segundo o procurador, os mesmos argumentos para a prisão de José Dirceu.

Dallagnol disse que não entende o que chamou de tratamento diferenciado dado ao ex-ministro. O procurador afirmou que a prisão é um remédio amargo, mas necessário.

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